
17/04/2015 – O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) manteve decisão liminar que condenou o site de buscas Google Brasil Internet Ltda a pagar multa diária por não retirar dois vídeos que acusam magistrados do Estado de corrupção, postados no site Youtube e intitulados “Venda de Sentença em Mato Grosso” e “Bandidos de Toga”.
No entanto, a 1ª Câmara Cível do TJ-MT reduziu a multa de R$ 100 mil para R$ 50 mil por cada dia em que os vídeos continuarem disponíveis para acesso.
Na decisão, o relator do caso, desembargador João Ferreira Filho, destacou que a empresa fez uma “sustentação cínica” ao alegar que não possuiria meios de fazer a retirada e impedir a nova publicação dos vídeos.
Nos vídeos em questão, o pecuarista e piscicultor Áureo Marcos Rodrigues acusa o juiz Emerson Cajango, que atua em Cuiabá, de desvio de conduta, perseguição e venda de sentença. Ele também cita o desembargador Márcio Vidal na filmagem.
Ambos os magistrados já conseguiram decisões liminares para que os vídeos fossem retirados do ar, mas as medidas não foram cumpridas. A última decisão foi proferida pelo juiz José Arimatéa, em agosto do ano passado, que atendeu pedido de Márcio Vidal.
“Tecnicamente impossível”
O Google então interpôs recurso ao TJ-MT, sob o argumento de que a decisão de José Arimatéa foi “genérica”, pois não especificou de forma clara como deveria ocorrer a remoção deste conteúdo.
A empresa alegou que não possui controle preventivo e nem influencia os conteúdos postados no YouTube, pois o site simplesmente hospeda páginas e conteúdos pessoais “sem prévio monitoramento ou censura”.
Conforme o Google, seria “tecnicamente impossível” monitorar o sistema de tal forma que estes vídeos não pudessem ser publicados e, mesmo que fosse possível, tal medida afrontaria a Constituição Federal, que não permite a censura prévia.
Outra queixa foi em relação à multa de R$ 100 mil por dia, considerada “astronômica” pela empresa.
Sustentação “cínica”
Em um longo voto, o desembargador João Ferreira Filho refutou toda a defesa do site de buscas, a começar pela tese de que a decisão não especificou que conteúdos deveriam ser removidos.
“Ora, antes de demandar, o autor/agravado suplicou ao Google que removesse os posts que lhe ofendiam gratuitamente a honra pessoal, e identificou e indicou com absoluta precisão quais eram esses “Causa espécie a sustentação cínica de que, como o Google não dispõe de logística capaz de monitorar previamente os conteúdos postados e impedir ataques injustos à honra das pessoas, o site estaria isento de toda e qualquer responsabilidade” conteúdos ofensivos (cf. fls. 233/247), os quais, inclusive, foram facilmente localizados pelo agravante, que, depois de soberanamente julgá-los inofensivos, repeliu soberbamente o pleito extrajudicial de remoção dos posts (cf. fls. 249/252). Agora, como se desconhecesse os fatos e as circunstâncias íntimas do caso, vem dizer que a ordem é genérica, imprecisa e de execução impossível. Não procede!”, disparou.
João Ferreira aproveitou a oportunidade para tecer críticas à crença do Google de que o desembargador ofendido deveria “se entender exclusivamente com o ofensor, excluindo do processo o site de busca, para que ele, intocado, siga faturando livre, leve e solto”.
“Causa espécie a sustentação cínica de que, como o Google não dispõe de logística capaz de monitorar previamente os conteúdos postados e impedir ataques injustos à honra das pessoas, o site estaria isento de toda e qualquer responsabilidade”, cutucou.
O desembargador também contou um pouco da história da criação do Google e reiterou que a empresa tem o dever de criar meios para impedir que este tipo de conteúdo seja postado.
“É astronômico o que eles ganham e não se preocupam com as pessoas” Outro ponto exibido na decisão foi o fato de, segundo João Ferreira, o Google não ter comprovado a impossibilidade de impedir previamente a publicação de tais vídeos ofensivos.
“Porque, como há notícias de que determinados conteúdos criminosos e/ou socialmente nocivos (terrorismo, pedofilia, drogas etc) são contidos por filtros dotados de alguma eficácia bloqueadora, cumpre ao agravante comprovar a impossibilidade técnica de aplicar a mesma solução para o caso presente”, votou.
Além de acompanhar o voto, a desembargadora Serly Marcondes também criticou a conduta do Google: “é astronômico o que eles ganham e não se preocupam com as pessoas”.
O desembargador Adilson Polegato teve o mesmo entendimento e a decisão contra o Google foi unânime.
A polêmica
A denúncia do pecuarista contra Emerson Cajango, que acabou “respingando” em Márcio Vidal, havia sido feita publicamente, por meio de dois vídeos hospedados no Youtube, em que Áureo Rodrigues acusa o juiz de participar de um suposto esquema de venda de sentença na Justiça Estadual.
Nos videos, Cajango é acusado de ter agido com desvio de conduta e “perseguição” contra o pecuarista, em processo julgado pelo juiz em 2006, quando atuava na comarca de Porto Esperidião e Mirassol D’Oeste.
Ainda no vídeo, também consta a filmagem de um protesto feito por Áureo Rodrigues em cima de sua camionete, na praça de Porto Esperidião.
Na manifestação, ele afirmava que teria ocorrido “venda de sentença” quando o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) negou exceção de suspeição que ele impetrou contra Emerson Cajango, em 2007.
Outros magistrados mato-grossenses também são citados na filmagem e tachados de “criminosos”, “corruptos” e “bandidos de toga”.
O pecuarista Áureo Marcos Rodrigues, durante protesto
Todas as acusações do pecuarista são referentes a atuação do juiz em dois processos, em que ele movia no Judiciário. Nas duas ações, o juiz negou os pedidos feitos por ele.
O primeiro processo é de 2006 e Áureo Rodrigues pleiteava indenização de seu vizinho Sylvio Fonseca, após uma represa ter rompido e ocasionado a morte de 80 mil peixes nos tanques de sua propriedade. O prejuízo seria de R$ 400 mil.
Na ação, ele também tentava impedir que o mesmo ampliasse uma represa para armazenamento de água.
O juiz negou os pedidos do pecuarista e autorizou a continuidade da obra.
Já no segundo processo, Aureo discutia a servidão de passagem de uma área dentro de sua propriedade. O magistrado teria indeferido o pedido do pecuarista.
Além disso, durante a instrução Emerson Cajango determinou inquérito policial para apurar se Aureo teria quebrado o sigilo telefônico dos peritos da ação, em uma suposta tentativa de produzir prova falsa e interferir no processo.
Contra essa atitude de Cajango, o pecuarista protocolou uma reclamação na Corregedoria Geral da Justiça – posteriormente arquivada – e impetrou exceção de suspeição contra o magistrado, com a alegação de que os julgamentos foram proferidos com “evidente parcialidade” e, ainda, que o juiz nutria “inimizade capital” contra o autor da ação.
Cajango não se declarou suspeito. O autor então recorreu ao Tribunal de Justiça e o então juiz Marcelo Souza de Barros, relator do caso, negou o pedido, em 2007.
Na decisão, Marcelo Barros entendeu que o pedido se tratava de “mero desequilíbrio” do pecuarista. Todos os magistrados da Sexta Câmara Cível, então presidida pelo desembargador Juracy Persiani, acompanharam o voto do magistrado.
A negativa foi apontada como “venda de sentença” pelo pecuarista pois, de acordo com as declarações contidas no vídeo, os magistrados que julgaram a exceção de suspeição teriam ignorado decisão da Turma Recursal que o absolveu do crime de quebra de sigilo telefônico e produção de prova falsa, o que supostamente tornaria parcial a determinação de Cajango em investigá-lo.FONTE SITE MIDIAJUR